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Nações Unidas
CAT/OP/BRA/R.1
Protocolo Facultativo à
Convenção contra a Tortura e outros
Tratamentos ou Penas Cruéis,
Desumanos ou Degradantes
Distr.: Restrita
08 de fevereiro de 2012
Original: inglês
Subcomitê de Prevenção da Tortura e
outros Tratamentos ou Penas Cruéis,
Desumanos ou Degradantes
Relatório sobre a visita ao Brasil do Subcomitê de Prevenção
da Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis,
Desumanos ou Degradantes
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Sumário
I. INTRODUÇÃO.................................................................................................................3
II. MECANISMO NACIONAL DE PREVENÇÃO..........................................................4
III. TEMAS ABRANGENTES............................................................................................6
A. Estrutura Legal................................................................................................................6
B. Estrutura Institucional ....................................................................................................6
C. Atenção à saúde ...............................................................................................................8
D. Impunidade ....................................................................................................................11
E. Corrupção.......................................................................................................................12
F. Represálias......................................................................................................................12
IV. SITUAÇÃO DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE..................................13
A. Detenção Policial............................................................................................................13
B. Instituições Penitenciárias.............................................................................................17
C. Instituições para Crianças e Adolescentes...................................................................24
D. Outras Instituições.........................................................................................................29
ANEXOS .............................................................................................................................31
Anexo I.................................................................................................................................31
Lista de pessoas com as quais o SPT se encontrou ..........................................................31
Anexo II ...............................................................................................................................35
Locais de Privação de Liberdade......................................................................................35
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I. Introdução
1. De acordo com os artigos 1 a 11 do Protocolo Adicional à Convenção contra a Tortura (OPCAT), o Subcomitê de Prevenção à Tortura (SPT) realizou visita ao Brasil entre 19 e 30 de setembro de 20111.
2. O SPT foi representado pelos seguintes membros: Wilder Tayler (Chefe de Delegação), Mario Coriolano, Marija Definis-Gojanovic, Suzanne Jabbour, Goran Klemencic, Petros Michaelides, Christian Pross e Felipe Villavicencio.
3. O SPT foi auxiliado por quatro funcionários de Direitos Humanos do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos (ACNUDH). O Subcomitê foi também auxiliado por funcionários de segurança e por intérpretes das Nações Unidas.
4. Durante a visita ao Brasil, o SPT vistoriou o tratamento recebido por pessoas privadas de liberdade em quatro estados diferentes2. Em São Paulo, o trabalho do SPT focou-se nos centros de detenção juvenil, enquanto a visita aos outros estados abrangeu uma série de instituições.
5. Ainda que não se faça menção, neste relatório, a todos os locais visitados, o SPT se reserva ao direito de fazer comentários sobre qualquer local visitado em seu diálogo futuro com o Estado Parte. A ausência de qualquer menção, neste relatório, relativa a alguma instituição em particular visitada pelo SPT tampouco implica uma avaliação positiva ou negativa.
6. Além de realizar visitas a locais de detenção, o SPT participou de reuniões com autoridades governamentais, com o Sistema ONU no Brasil, e com membros da sociedade civil3. O SPT gostaria de agradecê-los pelas valiosas informações fornecidas.
7. Ao final de sua visita, o SPT apresentou oralmente suas observações preliminares confidenciais às autoridades brasileiras4. O Governo brasileiro submeteu seus comentários a essas observações preliminares em 28 de novembro de 2011. No presente relatório, o SPT apresenta suas avaliações e recomendações concernentes à prevenção da tortura e dos maus-tratos de pessoas privadas de liberdade no Brasil. Este relatório utiliza o termo genérico “maus-tratos” para referir-se a qualquer forma de tratamento ou punição cruel, desumana ou degradante5.
8. O SPT recorda que muitas das recomendações feitas no presente relatório não estão sendo apresentadas ao Brasil pela primeira vez, considerando-se visitas anteriores dos mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas. Infelizmente, o SPT detectou muitos
1 Para maiores informações sobre o STP, consulte o sítio http://www2.ohchr.org/english/bodies/cat/opcat/index.htm
2 Ver Anexo II.
3 Ver Anexo I.
4 As observações preliminares foram transmitidas posteriormente ao Estado parte por escrito em 14 de outubro de 2011.
5 Em concordância com o artigo 16 da Convenção Contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. XXX
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problemas semelhantes aos identificados nessas visitas anteriores
6, ainda que tenha havido progresso em algumas áreas específicas. O SPT está ciente de que recomendações recorrentes e consistentes feitas, durante vários anos, por diferentes mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas não foram implementadas em sua totalidade. O SPT espera que sua visita e as recomendações que dela resultam sejam observadas e propiciem um grande impulso para que o Governo brasileiro tome ações decisivas no sentido de erradicar a tortura e os maus-tratos infligidos a todas as pessoas privadas de liberdade.
9. O SPT solicita que as autoridades brasileiras lhe forneçam uma resposta, dentro do prazo de seis meses a partir da data de transmissão desse relatório, por meio da qual preste contas das ações estatais levadas a cabo com vistas à implementação de suas recomendações.
10. O presente relatório permanecerá confidencial até o momento em que as autoridades brasileiras decidam torná-lo público, conforme estipulado pelo artigo 16(2) do OPCAT. A publicação deste relatório, sem dúvida, servirá de meio adicional para prevenir a tortura e os maus-tratos no Brasil, uma vez que o SPT considera que a ampla disseminação das recomendações contribuiria para um diálogo nacional transparente e frutífero sobre os assuntos abordados pelo relatório.
11. O SPT deseja chamar a atenção do Estado Parte para o Fundo Especial estabelecido em concordância com o artigo 26 do OPCAT. As recomendações contidas nos relatórios públicos da visita do SPT podem constituir as bases de uma solicitação do Estado Parte para o financiamento de projetos específicos por meio do Fundo Especial7.
12. O SPT recomenda que o Brasil solicite a publicação do presente relatório, em conformidade com o artigo 16(2) do OPCAT.
13. O SPT deseja expressar sua gratidão às autoridades brasileiras e, em particular, aos pontos focais governamentais na Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, por sua cooperação positiva e pela facilitação da visita.
14. Maiores detalhes sobre as preocupações expressadas pelo SPT com relação ao acesso e cooperação estão contidos nas observações preliminares confidenciais.
II. Mecanismo Nacional de Prevenção
15. O Brasil deveria ter estabelecido ou designado um Mecanismo Preventivo Nacional (MPN) dentro de, no máximo, um ano após a data de ratificação do OPCAT8. No momento da visita, entretanto, o MPN brasileiro ainda não tinha sido estabelecido. Durante o último
6 Relatório do Relator Especial sobre Tortura, Sir Nigel Rodley, durante sua visita ao Brasil, E/CN.4/2001/66/Add.2; Relatório sobre o Brasil produzido pelo Comitê contra a Tortura (CAT), CAT/C/39/2; Relatórios do Relator Especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, A/HRC/14/24/Add.4 e A/HRC/11/2/Add.2.
7 Ver http://www.2ohchr.org/english/bodies/cat/opcat/SpecialFund.htm
8 De acordo com o artigo 17 do Protocolo Facultativo à Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
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dia da visita do SPT ao país, o Governo brasileiro apresentou ao SPT um projeto de lei sobre o MPN, que foi submetido ao Congresso Nacional logo em seguida, como Projeto de Lei 2442/2011. O SPT compraz-se com essa evolução e espera que a discussão do projeto de lei no Congresso transcorra rapidamente.
16. Para além do seu mandato sob o artigo 11(b)(i) do OPCAT, o SPT gostaria de expressar suas visões a respeito do Projeto de Lei sobre o MPN. Enquanto o SPT considera que muitos elementos desse projeto são positivos e refletem as disposições do OPCAT, o SPT continua preocupado com o método de escolha dos membros do MPN. O atual projeto propõe um sistema em que a Presidenta do Brasil escolhe os membros do MPN entre uma lista de candidatos preparada pelo Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, cujos membros, por sua vez, são selecionados e indicados pela Presidenta. Nesse sentido, o SPT relembra suas Diretrizes sobre os MPNs9, que defendem um processo aberto, transparente e inclusivo para a seleção e indicação dos membros do MPN. Tal processo deve envolver uma vasta gama de partes relevantes, incluindo a sociedade civil, e deve estar de acordo com os critérios publicizados. Ademais, o projeto de lei não faz referência à necessidade de esforços com vistas ao balanceamento com relação a gênero e à adequada representação de grupos étnicos e minoritários na composição do MPN, conforme previsão do artigo 18 do OPCAT e dos Princípios de Paris10.
17. O SPT recomenda que o Estado Parte realize as mudanças necessárias, de forma a garantir um processo aberto, transparente e inclusivo – em particular com relação à sociedade civil –, com vistas à seleção e indicação dos membros do MPN. O SPT também recomenda que se garanta o balanceamento com relação ao gênero, bem como à representação étnica e de minorias, na composição do MPN. Alinhado com os princípios da cooperação e do diálogo construtivo com os Estados partes, e em conformidade com o artigo 11(b)(iv), o SPT expressa seu desejo de prestar assistência ao Estado Parte para o estabelecimento do MPN.
18. Devido à estrutura federal do país, os estados brasileiros começaram a criar mecanismos locais para a prevenção da tortura em nível estadual. Na ocasião da visita, três estados (Alagoas, Paraíba e Rio de Janeiro) possuíam legislação que estabelece mecanismos locais. Dos três, somente o Rio de Janeiro possuía um mecanismo em funcionamento. O SPT demonstra satisfação com essas evoluções e é da opinião que a criação desses mecanismos estaduais deveria ser encorajada pelas autoridades federais e dos Estados.
19. A delegação se encontrou com o Mecanismo Preventivo do Rio de Janeiro. Este mecanismo atende aos requisitos do OPCAT e tem potencial para se tornar um ator chave na prevenção da tortura. Sua eficácia, contudo, é prejudicada pela falta de recursos materiais.
20. O SPT recomenda que autoridades federais e estaduais relevantes forneçam ao mecanismo do Rio de Janeiro, assim como a outros mecanismos a serem criados,
9 Diretrizes do SPT sobre mecanismos de prevenção nacional, CAT/OP/12/5.
10 Princípios relativos ao status das instituições nacionais para a promoção e proteção dos direitos humanos (“Princípios de Paris”), anexos à resolução 48/134 da Assembleia Geral (AGNU).
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independência funcional e recursos suficientes, que lhes permitam realizar suas funções de modo efetivo, de acordo com o que dispõe o OPCAT.
III. Temas Abrangentes
21. Além de examinar a situação específica das pessoas privadas de liberdade, o SPT analisou uma série de temas sistêmicos gerais relativos ao tratamento das pessoas privadas de liberdade. Estes temas são abordados nas seguintes seções de A a F.
A. Estrutura Legal
22. O SPT concorda com outros mecanismos das Nações Unidas que têm declarado que o quadro jurídico brasileiro sobre a prevenção da tortura é, em grande medida, adequado11. A definição de tortura em sua legislação interna, bem como as salvaguardas jurídicas existentes contra a tortura, os maus-tratos e os direitos das pessoas privadas de liberdade, estão, de maneira geral, em conformidade com os padrões internacionais. O SPT preocupa-se, contudo, com a lacuna existente entre o aparato jurídico e sua aplicação na prática, uma vez que a maioria das garantias e dos direitos dispostos na legislação nacional são amplamente ignorados. Conforme observado pelo Relator Especial sobre Tortura, no seguimento de sua visita em 2001, muitas das recomendações meramente solicitavam que as autoridades respeitassem as leis brasileiras existentes12.
B. Estrutura Institucional
23. A prevenção da tortura em locais de privação de liberdade é uma responsabilidade compartilhada por diversas instituições que trabalham no campo da administração da justiça. O SPT expressa preocupação com o fato de a atual estrutura institucional no Brasil não proporcionar proteção suficiente contra a tortura e os maus-tratos.
1. Sistema de Defensoria Pública
24. A assistência jurídica gratuita para aqueles que não podem pagar por um advogado é garantida pela Constituição Brasileira. Por meio de entrevistas realizadas com pessoas privadas de liberdade, o SPT descobriu que, entretanto, a assistência jurídica gratuita não era disponibilizada a todos que dela necessitavam.
25. Durante sua visita, o SPT se reuniu com defensores públicos, estaduais e federais, para inteirar-se sobre dos desafios que enfrentam. Em geral, o SPT foi informado que a falta de autonomia institucional, bem como de recursos humanos, em particular quando comparado
11 Observações conclusivas do Comitê contra Tortura sobre o Brasil, A/56/
44, parágrafos 115-120; Relatório sobre o Brasil produzidos pelo CAT sob o artigo 20 da Convenção e resposta do governo brasileiro, CAT/C/39/2, parágrafo 37; observações conclusivas do Comitê dos Direitos da Criança sobre o Brasil, CRC/C/15/Add.241, parágrafos 5 e 7, Relatório do Relatório Especial sobre Tortura, Sir Nigel Rodley, em sua visita ao Brasil, E/CN.4/2001/66/Add.2, parágrafo 161.
12 Relatório do Relator Especial, E/CN.4/2011/66/Add.2, parágrafo 168.
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ao Ministério Público, dificultava o trabalho dos defensores públicos
13. Além disso, o SPT observou que, no estado de Goiás, não havia sistema de defensoria pública.
26. O SPT recomenda que se garanta autonomia às defensorias públicas e que lhes sejam fornecidos recursos financeiros e materiais suficientes para lhes permitir oferecer defesa legal adequada a todas as pessoas privadas de liberdade. O SPT recomenda ainda que o Estado Parte acelere a criação e a efetiva implementação de um sistema de defensoria pública naqueles estados que não dispõem de tal órgão.
27. O SPT recomenda que as defensorias públicas mantenham um registro central das alegações de tortura e de maus-tratos, incluindo informações confidenciais que se lhes sejam fornecidas. O SPT recomenda também que os defensores públicos cooperem e se coordenem com os mecanismos nacionais e/ou locais de prevenção, em particular para evitar retaliações que se sigam a visitas de monitoramento.
2. Judiciário
28. De acordo com as informações coletadas, os juízes raramente faziam perguntas aos detentos sobre o tratamento que recebiam durante a investigação. Os juízes devem permanecer vigilantes aos sinais de tortura e de maus-tratos, bem como realizar os passos necessários para corrigir e pôr termo a essas situações.
29. O SPT recomenda que os juízes sejam obrigados por lei a consultar todas as pessoas detidas acerca do tratamento recebido ao longo das investigações, a registrar por escrito quaisquer alegações de tortura ou maus-tratos, bem como a determinar a realização imediata de exames médicos forenses sempre que houver motivos para se acreditar que algum detido tenha sido submetido a tortura ou a maus-tratos.
30. De acordo com a lei brasileira, as confissões são admitidas como provas judiciais, exceto nos casos em que tenham sido obtidas por meio da violação de disposições constitucionais ou de outros dispositivos legais 14. A despeito da vedação legal às provas obtidas por meio ilícito, tem-se notícia de que confissões – incluídas aquelas obtidas mediantes tortura – têm sido utilizadas em procedimentos judiciais.
31. O SPT recomenda fortemente que os juízes se recusem a aceitar confissões quando houver motivos razoáveis para se acreditar que tenham sido obtidas por meio de tortura ou de maus-tratos. Nesses casos, os juízes deverão notificar imediatamente a Polícia e/ou o Ministério Público, de modo a que uma investigação possa ser iniciada.
3. Mecanismos de Fiscalização e Reclamação
32. O SPT tomou nota da existência de mecanismos de fiscalização e reclamação em muitos dos locais visitados. Esses mecanismos incluíam ouvidorias, corregedorias e juízes
13 De acordo com as informações fornecidas pelo Governo Federal em resposta às observações preliminares do SPT, nos últimos quatros anos, o Governo brasileiro investiu cerca de US$ 8 milhões em defensores públicos em 18 estados para fornecer assistência jurídica a detentos.
14 CF, artigo 34; CPP, artigo 157.
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de execução penal. O SPT recebeu, entretanto, diversas alegações, por parte de detentos entrevistados, a respeito de punições que teriam recebido por haverem encaminhado reclamações, as quais tampouco recebiam resposta. Os entrevistados também alegaram que os juízes raramente os visitavam. O SPT deseja enfatizar que a mera existência de mecanismos de queixas não é suficiente; esses devem ser, e devem ser percebidos como sendo independentes e imparciais. Devem ainda oferecer garantias de efetividade, prontidão e celeridade.
33. Com relação a esse tema, o SPT recomenda que todas as pessoas privadas de liberdade sejam informadas a respeito de seu direito de submeter diretamente reclamações confidenciais à autoridade responsável pela administração dos locais de detenção, às autoridades superiores e a autoridades com poderes de correição. Informações acerca desse direito devem ser fornecidas por escrito, em linguagem que possa ser compreendida no momento da chegada aos locais de detenção, assim como se devem fazer conhecidas em todos os locais de detenção, por meio de placas e pôsteres afixados, de modo visível, nos locais de detenção. O direito a submeter reclamações deve ser garantido na prática e as reclamações devem ser recebidas sem censura de sua substância, além de serem analisadas e respondidas sem demoras indevidas. Os indivíduos que realizarem reclamações não devem ser submetidos a qualquer forma de retaliação ou preconceito. As autoridades relevantes devem manter registro de todas as reclamações recebidas, incluindo sua natureza, instituições de onde se originam, data de recebimento, data da decisão, natureza da decisão e quaisquer providências tomadas em consequência daquelas. Esses registros devem ser disponibilizados a órgãos externos de monitoramento.
4. Instituto de Medicina Forense
34. A maioria dos institutos de medicina forense no Brasil é subordinada às Secretarias de Segurança Pública dos Estados, que controlam a polícia. O SPT preocupa-se que isso possa exercer um impacto negativo na independência d
os profissionais forenses e em sua capacidade de realizar exames médicos sem interferências indevidas.
35. O SPT recomenda que todos os institutos forenses se tornem independentes das Secretarias de Segurança Pública. O SPT também recomenda que o Estado Parte estabeleça um sistema de exame independente, de acordo com o Protocolo de Istambul15, segundo o qual médicos forenses e psicólogos devem realizar investigações completas quando o médico que examinar o detido tenha motivos para supor que os indivíduos tenham sido submetidos a tortura e/ou a maus-tratos.
C. Atenção à saúde
36. O SPT considera que a situação de saúde na maior parte das instalações visitadas era extremamente preocupante. As preocupações gerais incluem a falta de recursos financeiros,
15 O Manual sobre Investigação Efetiva e Documentação de Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (Protocolo de Istambul), adotado em 1999, HR/P/PT8/Ver.1.
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materiais e humanos, além da subordinação dos serviços de saúde aos serviços de segurança.
37. Nas delegacias de polícia, não havia acesso a médicos. Realiza-se um exame de corpo de delito nos detentos logo após sua prisão, normalmente antes de sua admissão na delegacia de polícia. Todos os detentos entrevistados pelo SPT afirmam que esse exame era superficial e conduzido de forma perfuntória.
38. Exames médicos e o registro apropriado das lesões sofridas por pessoas privadas de liberdade constituem importantes salvaguardas para a prevenção da tortura e dos maus-tratos, bem como para o combate à impunidade16. Essas providências podem também proteger os funcionários da polícia e das prisões contra falsas alegações. Os Estados devem levar a cabo uma investigação imparcial quando houver motivo razoável para se acreditar que um ato de tortura ou de maus-tratos tenha sido cometido17. Aqueles exames devem ser realizados, em privado, por um profissional de saúde treinado em diagnosticar lesões – incluindo exames médicos e psicológicos minuciosos e independentes. Deve ser mantida a confidencialidade dos resultados desses exames, especialmente com relação à polícia e a funcionários de estabelecimentos prisionais. Esses resultados deverão ser compartilhados somente com o detento ou seu advogado, de acordo com o Protocolo de Istambul.
39. O SPT recomenda que se faculte a todas as pessoas detidas a realização de um exame médico, assim que possível, após a sua detenção inicial. Esse exame deverá ser independente, gratuito e conduzido de acordo com o Protocolo de Istambul. O SPT recomenda também que se estabeleça um sistema que garanta o acesso pronto e gratuito a cuidados e tratamento médicos para aqueles sob a custódia policial, sempre que necessário.
40. Nas prisões, a assistência médica era irregular e, na maioria dos casos, o acesso aos serviços médicos ocorria com grandes atrasos. Além disso, não havia funcionários médicos à noite ou nos fins de semana. A equipe médica era insuficiente e incluía detentos não qualificados para prestar serviços médicos. Por exemplo, em uma prisão visitada, o SPT foi informado de que havia somente um médico presente, uma vez por semana, para atender mais de 3000 prisioneiros.
41. O SPT recomenda que a assistência médica nas prisões seja disponibilizada 24 horas por dia e 7 dias por semana. As condições de trabalho da equipe médica, incluindo salários, devem ser adequadas, de modo a atrair pessoal qualificado. Os detentos não se devem envolver na prestação de serviços médicos.
42. De acordo com as informações recebidas, os prisioneiros não passavam por exames médicos ao dar entrada na prisão. Os detentos informaram, ainda, que o acesso aos serviços médicos era frequentemente prestado a critério dos guardas das prisões ou dos “faxinas”, detentos que trabalham para a instituição.
16 CAT, comentário geral nº 2, CAT/C/GC/2, parágrafo 13.
17 UNCAT, art. 12
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43. O SPT recomenda que o Estado Parte garanta que um profissional de saúde examine todos os detentos assim que possível, após sua admissão, e sempre que necessário, de acordo com os padrões internacionais18. Aos detentos deverá ser facultado procurar assistência médica profissional, de modo confidencial, sem que seu pedido seja obstruído ou filtrado por guardas ou outros detentos.
44. O SPT encontrou casos de grave negligência, incluindo detentos com doenças crônicas graves, membros quebrados ou outros ferimentos sem tratamento. Os detentos expressaram sua apreensão com relação à solicitação de assistência médica, baseados na experiência de punição por guardas das prisões, ou de maus-tratos quanto do transporte até o hospital.
45. O SPT recomenda que sejam transmitidas instruções claras às autoridades prisionais, no sentido de que nenhum detento seja punido por solicitar assistência
médica. O SPT recomenda que as políticas de segurança para a transferência de pessoas para instalações médicas externas sejam revisadas.
46. As condições materiais na maioria das unidades médicas eram espantosas e havia carência de equipamentos médicos e de medicamentos.
47. O SPT recomenda que as condições materiais das unidades médicas das prisões sejam melhoradas imediatamente e que equipamentos adequados e materiais farmacêuticos necessários sejam providenciados.
48. O SPT recebeu alegações de prisioneiras gestantes e prisioneiras com crianças na prisão sobre a falta de cuidado obstetrício e o atraso na aplicação de vacinas em crianças, o que está em contradição com as leis brasileiras19.
49. O SPT recomenda que mulheres grávidas recebam, de um profissional de saúde qualificado, aconselhamento regular a respeito de sua saúde. O SPT recomenda que se disponibilize às crianças que vivam com suas mães na prisão serviços de saúde contínuos e que seu desenvolvimento seja monitorado por especialistas20.
50. Durante sua visita às instituições para crianças e adolescentes, o SPT observou hematomas e outros tipos de lesão sem tratamento. Segundo alegações, as lesões eram desconsideradas e frequentemente encobertas pelo pessoal médico como sendo frutos de acidentes. O SPT considera que tais alegações contradizem os princípios éticos a que a
18 Regras Mínimas Padrão para o tratamento de Prisioneiros (SMRTP), regra 24; Corpo de Princípios para a Proteção de todas as Pessoas sob qualquer Forma de Detenção ou encarceramento, princípio 24.
19 Lei 7210/1984, art,14(3); Regras Mínimas para o Tratamento do preso no Brasil (Regras Mínimas), resolução do CNPCP nº 14 de 11 de novembro de 1994, art. 16.
20 Regras das Nações Unidas para o tratamento de Mulheres Prisioneiras e Medidas não-custodiantes para Mulheres Infratoras (as “Regras de Bancoc”), adotadas pela resolução 65/229 da Assembleia Geral, regras 48 e 51.
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profissão médica se submete
21. O pessoal médico entrevistado reconheceu a presença de guardas em consultas médicas prestadas a crianças ou adolescentes.
51. O SPT recomenda que o Estado Parte dê claras instruções aos médicos que trabalham em locais de privação de liberdade no sentido de que nenhum ato suspeito de tortura ou de maus-tratos seja ocultado ou ignorado e que os mesmos sejam relatados às autoridades relevantes. Exames médicos devem ser realizados em estrita confidencialidade. Como regra, os guardas não devem poder assistir ou escutar os exames médicos; caso contrário, sua presença deverá constar dos registros médicos. Os arquivos médicos deverão permanecer confidenciais.
D. Impunidade
52. A impunidade por atos de tortura está disseminada e se evidencia pelo fracasso generalizado em levar-se os criminosos à justiça, bem como pela persistência de uma cultura que aceita os abusos cometidos pelos funcionários públicos. Em muitas de suas reuniões, o SPT solicitou acesso ao número de indivíduos sentenciados pelo crime de tortura, mas o dado não foi fornecido22. Os indivíduos entrevistados pelo SPT não demonstraram esperança de que justiça fosse feita ou de que sua situação particular fosse considerada pelas instituições estatais.
53. O SPT recomenda que todas as alegações de tortura e de maus-tratos sejam rigorosamente investigadas, de modo rotineiro, e que os perpetradores sejam responsabilizados por seus atos. O Estado Parte deve emitir uma forte condenação, no mais alto nível, declarando que a tortura não será tolerada sob nenhuma circunstância. Essa mensagem de “tolerância zero” com relação à tortura e aos tratamentos desumanos deve ser encaminhada, em intervalos regulares, a todas as forças de segurança e equipes de custódia, inclusive por meio de treinamento profissional.
54. O SPT tomou conhecimento de que ouvidorias e corregedorias de polícia não possuem capacidade investigativa própria e que dependem de inquéritos conduzidos pela polícia, inclusive em casos nos quais é alegada tortura. Esse arranjo institucional pode prejudicar a imparcialidade dos inquéritos e contribuir para a impunidade.
55. O SPT recomenda que a integridade do trabalho de ouvidores e de corregedores seja protegida por meio do fortalecimento de sua independência e da garantia de sua efetiva capacidade de investigação.
21 Princípios de Ética Médica relevantes ao Papel do Funcionário Médico, em particular físicos, na Proteção de Prisioneiros e Detentos Contra Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotados pela resolução 37/194 da AGNU em 18 de dezembro de 1982; Declaração de Tóquio, adotada pela 29ª Assembleia Médica Mundial, em Tóquio, outubro de 1975.
22 De acordo com a informação fornecida pelo Estado Parte durante a visita, em abril de 2011, houve 160 pessoas acusadas pelo crime de tortura no contexto de uma população carcerária de 512.000 detentos.
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E. Corrupção
56. O SPT demonstrou grave preocupação com respeito às numerosas e consistentes alegações de corrupção que recebeu. Os exemplos incluem o pagamento, pelos detentos, de suborno no montante de R$10.000,00 aos policiais, para serem libertados; o roubo de provas por policiais; o pagamento de suborno, pelos detentos, para a satisfação de necessidades básicas, como banho de sol; o pagamento, por parte dos familiares, para poderem visitar os detentos; pagamento em troca de proteção, etc. O SPT recebeu alegações de que algumas pessoas estavam sendo mantidas em delegacias de polícia enquanto se aguardava o pagamento de suborno para que pudessem ser transferidas para instalações de detenção pré-julgamento.
57. Ademais, a corrupção foi evidenciada pelo controle quase completo de certos locais de detenção pelos grupos do crime organizado. Os salários inadequados dos policiais foram citados como uma das causas originárias da corrupção23.
58. O SPT recomenda:
a) a adoção e a implementação, pelas autoridades policiais e prisionais do mais alto nível, de uma política firme e transparente de tolerância zero com relação à corrupção;
b) o treinamento de policiais e de agentes penitenciários e a revisão dos salários da polícia e dos funcionários penitenciários;
c) a adoção de medidas para aprimorar o escrutínio público por parte da sociedade civil, como meio de aprimorar a prestação de contas;
d) a realização de uma campanha para sensibilizar funcionários do sistema de justiça, bem como o público em geral, sobre a necessidade de se combater a corrupção em locais de detenção e de conscientizá-los das consequências adversas da corrupção;
e) a investigação das alegações de corrupção e, nos casos em que se suspeite que um crime foi cometido, o encaminhamento de informação relevante ao Ministério Público;
f) a adoção de um plano de ação, que inclua objetivos, medidas e prazos, para a implementação das recomendações acima citadas.
F. Represálias
59. As sérias preocupações do SPT no tocante às represálias contra as pessoas entrevistadas, bem como a falta de controle apropriado de salvaguardas contra represálias, foram expressadas nas observações preliminares. O SPT saúda o comprometimento do
23 A/HRC/14/24/Add.4, parágrafos 35-39.
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Ouvidor Nacional dos Direitos Humanos em monitorar os locais de detenção visitados pelo SPT, com vistas a investigar a possível ocorrência de represálias
24.
60. De acordo com informações recebidas pelo SPT imediatamente após a visita, ocorreram represálias em pelo menos um dos locais visitados, a saber, o Presídio Feminino Nelson Hungria. Trata-se de violação às obrigações específicas do Brasil no âmbito OPCAT.
61. O SPT expressa sua forte condenação a esses e a quaisquer outros atos de represália e solicita ao Estado Parte que investigue imediatamente a situação e que responsabilize os responsáveis. O SPT reitera as recomendações feitas nas observações preliminares e destaca que aqueles que prestam informação para órgãos ou instituições de monitoramento, nacionais ou internacionais, não devem sofrer nenhuma punição ou quaisquer outras consequências negativas por ter fornecido informações.
62. O SPT solicita ser mantido informado sobre as atividades do Estado Parte com vistas a prevenir e a investigar represálias e solicita, também, receber relatório do Ouvidor Nacional dos Direitos Humanos sobre suas visitas com esse propósito específico, inclusive no tocante às medidas tomadas com relação às represálias registradas no Presídio Nelson Hungria.
IV. Situação das Pessoas Privadas de sua Liberdade
A. Detenção Policial
1. Questões Gerais
(a) Informação sobre os direitos dos detentos
63. Muitos entrevistados afirmaram que não tinham sido devidamente informados sobre seus direitos no momento de sua prisão25. Fornecer às pessoas privadas de liberdade as informações sobre seus direitos constitui uma salvaguarda fundamental contra a detenção arbitrária, a tortura e os maus-tratos.
64. O SPT recomenda que o Estado Parte garanta que instruirá os funcionários responsáveis pelas detenções a salvaguardar a implementação efetiva e sistemática dos direitos das pessoas privadas de liberdade de serem informadas oralmente e por escrito de seus direitos durante o período de detenção, em linguagem que possam entender, desde o início da detenção. Este procedimento deve ser registrado.
(b) Direito a informar terceiros sobre a detenção
24 Resposta do Estado Parte às observações preliminares confidenciais, de 28 de novembro de 2011.
25 Conjunto de Princípios, princípio 13.
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65. O direito de as pessoas privadas de liberdade informarem uma pessoa, de sua escolha, sobre sua detenção representa uma salvaguarda básica contra a tortura e os maus-tratos26. O SPT encontrou diversos casos em que as pessoas privadas de liberdade não tiveram a possibilidade de informar, por longos períodos de tempo, a um terceiro, de sua escolha, sobre sua detenção.
66. O SPT recomenda que as pessoas privadas de liberdade possam notificar ou solicitar que a autoridade competente notifique uma pessoa de sua escolha sobre sua detenção e sobre o local onde se encontra detida. Tal notificação deve ser realizada imediatamente após a detenção inicial ou prisão e também ser feita após qualquer transferência de um centro de detenção para outro. Idealmente, essa notificação deve ser feita por telefone; a data e hora, bem como a identidade da pessoa notificada, devem ser registradas.
(c) Direito à assistência legal
67. Um detento deve ter direito à assistência jurídica de sua escolha27, desde o momento inicial de sua prisão28. Um representante jurídico independente deve estar presente e assistir o detento em todas as entrevistas policiais, bem como perante o juiz, como uma salvaguarda fundamental contra a tortura e os maus-tratos. Se um detento houver sido submetido a tortura ou maus-tratos, o acesso à defesa facilitará seu direito de reclamação, além de exercer uma função preventiva.
68. O SPT recomenda que as autoridades garantam que as pessoas privadas de liberdade sejam consistentemente informadas de seu direito a ter acesso a um advogado de sua escolha, que pode ser providenciado gratuitamente pelo Estado, e de que são livres para exercer esse direito desde o momento de sua detenção ou privação de liberdade e durante todos os procedimentos criminais29.
(d) Categorias de detentos
69. O SPT encontrou situações em que os detentos eram mantidos em instalações policiais juntamente com pessoas que já tinham sido sentenciadas e deveriam ser colocadas em regime fechado ou semi-aberto para prisioneiros sentenciados. O SPT recorda que a separação entre pessoas acusadas e pessoas condenadas é uma importante obrigação segundo o direito internacional30.
70. O SPT recomenda que o Estado Parte garanta a separação efetiva entre detentos e presos sentenciados, e que a detenção policial seja reduzida ao mínimo, inclusive para detentos sob custódia. Pessoas condenadas não devem ser mantidas juntamente com acusados e devem ser transferidos para locais apropriados.
26 CAT/C/GC/2, parágrafo 13, Body of Principles, princípio 16(1).
27 Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ICCPR), art. 14, parágrafo 3(d).
28 CAT/C/GC/2, parágrafo 13.
29 Princípios básicos sobre o papel dos advogados, 8º Congresso da ONU sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Criminosos, Havana, 1990, princípio 7.
30 ICCPR, art. 10(2).
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(e) Duração da Detenção Policial
71. O SPT encontrou pessoas sendo mantidas em delegacias por longos períodos de tempo, muitas vezes por mais de um ano. Em alguns casos, a prisão prolongada coincidia com o fato de a pessoa já haver sido sentenciada, como descrito acima. Em outros casos, as pessoas ainda aguardavam o julgamento.
72. O uso de instalações policiais para deter pessoas por períodos prolongados de tempo é completamente inapropriado. O SPT recomenda que as autoridades competentes tomem medidas urgentes para transferir pessoas detidas por prolongados períodos de tempo em instituições policiais para locais apropriados a sua situação.
(f) Funcionários
73. O SPT expressa preocupação com relação aos problemas gerais de insuficiência de pessoal e à correlata corrupção policial. Como exemplo concreto, o SPT
pôde observar que a Polinter Grajaú estava sob o controle de uma milícia. O SPT ficou profundamente preocupado com a atmosfera tensa da Polinter Grajaú e com o modo pelo qual era administrada, assunto a qual se refere na seção III.E.
74. O SPT recomenda que o Estado Parte aloque um montante de seu orçamento que seja suficiente para garantir que a força policial seja integrada por agentes motivados e pagos apropriadamente, suficientemente treinados em técnicas modernas de investigação forense e com conhecimento apropriado acerca de abordagem de direitos humanos. Mecanismos internos de monitoramento deverão ser colocados em funcionamento para garantir a conformidade da atuação dos policiais com padrões internacionais de direitos humanos. As autoridades competentes deverão implementar políticas internas rigorosas, incluindo mecanismos de investigação e punição adequados, voltados para a erradicação da prática de transferir qualquer forma de autoridade sobre as instituições policiais para gangues ou outros grupos.
2. Condições da detenção
(a) Superlotação
75. O SPT recebeu alegações consistentes sobre a superlotação das instituições policiais, e pôde observar esse tipo de situação. Notadamente, no Polinter Grajaú, o SPT encontrou casos de grave superlotação em certas celas. Além disso, o SPT recebeu relatos confiáveis de que uma delas – cela 14, medindo aproximadamente 7m² – foi utilizada para reter uma quantidade extrema de pessoas enquanto aguardavam suas transferências para a prisão provisória Ary Franco. O SPT considera que submeter detentos a situações de superlotação extrema constitui uma forma severa de maus-tratos31.
31 Incluindo o Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotada pela resolução 34/169 da AGNU.
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76. O Estado Parte deve tomar imediatamente medidas para prevenir os níveis extremos de superlotação descritos32. Um mínimo de espaço em metros quadrados por detento deve ser estritamente respeitado, em consonância com parâmetros internacionais, em todas as instalações policiais do país.
(b) Condições materiais
77. O SPT notou que alguns esforços foram feitos no sentido de renovar algumas instituições policiais, como a Delegacia 76 em Niterói. Nas concentradoras, entretanto, o SPT encontrou motivo de preocupação no que se refere às condições materiais das instalações. Em relação a outros estados, o SPT recebeu relatos consistentes de que as instalações policiais se encontravam em condições muito precárias. As pessoas detidas nessas instalações eram frequentemente mantidas em celas em mau estado, sujas e abafadas, em condições sanitárias precárias ou inexistentes. Os leitos eram também inadequados ou inexistentes. Ademais, o SPT recebeu relatos consistentes sobre privação de comida, água, além de falta de acesso a ar fresco e exercícios, no caso de detenções policiais prolongadas.
78. O SPT recomenda que o Estado Parte conduza uma auditoria com alcance nacional a respeito do estado material das instalações policiais e que estabeleça um plano de ação para limpeza, renovação e reforma desses espaços. O Estado Parte deve tomar as medidas necessárias para garantir que as condições de detenção nas unidades policiais do país sejam urgentemente alinhadas aos padrões internacionais e que as necessidades básicas das pessoas privadas de liberdade sejam atendidas no que se refere a saneamento e limpeza, alojamento, alimentação, acesso a água e possibilidade de exercício físico. Aqueles em detenção policial por mais de 24 horas devem ter acesso mínimo a uma hora de exercício por dia ao ar livre.
3. Tortura e maus-tratos
79. O SPT recebeu diversas e consistentes alegações dos entrevistados acerca de tortura e de maus-tratos, cometidos, particularmente, pela polícia civil e militar. As alegações incluem ameaças, chutes e socos na cabeça e no corpo, além de golpes com cassetetes. Esses espancamentos aconteceram sob a custódia policial, mas também em ruas, dentro de casas, ou em locais ermos, no momento da prisão. A tortura e os maus-tratos foram descritos como violência gratuita, como forma de punição, para extrair confissões e também como meio de extorsão.
80. O SPT também recebeu relatos consistentes de crianças e adolescentes, sobre tortura e maus-tratos sofridos no momento da prisão e durante a custódia policial. As crianças e adolescentes alegaram que a tortura e os maus-tratos cometidos pela polícia militar ocorreram por ocasião da prisão e que os métodos incluíam tapas, chutes e socos em todas as partes do corpo. Uma prisioneira relatou que tinha sido estuprada por dois policiais no período em que esteve sob custódia policial.
32 Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas (“Princípios Interamericanos”), OEA/Ser/L/V/II.131 doc.26), princípio XVII.
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81. No tocante ao tratamento recebido durante a custódia policial, um prisioneiro relatou que os métodos de tortura utilizados em seu interrogatório incluíram asfixia, ao receber um saco plástico em sua cabeça, choques elétricos, ameaças psicológicas e banhos frios, ao longo de seis dias. O SPT também recebeu alegações de maus-tratos durante a custódia policial, tais como a obrigação de os detentos dormirem no chão em uma cela suja, sem o devido acesso a condições sanitárias, alimentação e água, incluindo a privação dos serviços de saúde. Crianças e adolescentes haveriam sido, segundo alegações, feridos pela polícia.
82. O SPT recebeu ainda alegações de espancamentos e maus-tratos como forma de punição. Por exemplo, um detento alegou que, durante sua custódia pela polícia civil, em um período de dois dias, foi mantido em uma cela suja de aproximadamente 8m² com 20 homens, e privado de alimentação e água. Quando os detentos reclamavam e pediam comida e água, eram espancados. Os prisioneiros também relataram terem sido mantidos em posições desconfortáveis (por exemplo, em uma postura em que o corpo era sustentado pelos joelhos dobrados) por períodos prolongados de tempo durante a custódia policial.
83. Em relação ao transporte, o SPT recebeu relatos consistentes de tortura e maus-tratos em viaturas policiais, incluindo superlotação de veículos e detenção prolongada nas viaturas, além de espancamentos durante a transferência.
84. No Polinter Grajaú, alguns prisioneiros temiam por suas vidas. Ali o SPT recebeu relatos consistentes de que a tortura e os maus-tratos eram lugar-comum. Essas práticas estavam relacionadas com a atmosfera geral tensa, as condições materiais precárias e a administração corrupta das instalações.
85. O SPT também observou o tratamento discriminatório de pessoas privadas de liberdade que necessitavam de proteção especial (os chamados “seguros”). Em uma instituição visitada, o SPT descobriu que as pessoas mantidas pela polícia na seção de “seguro” estavam em condições muito inferiores aos demais detentos e eram, segundo alegaram, submetidos a espancamentos frequentes.
86. O SPT considera que as alegações acima são casos de tortura física e mental ou de maus-tratos. O SPT condena todos os atos de tortura e de maus-tratos e relembra que a tortura não pode ser justificada sob nenhuma circunstância. O SPT reitera seu chamado às autoridades brasileiras para que condenem firme e publicamente qualquer ato de tortura e que tomem todas as medidas necessárias para prevenir tortura e maus-tratos. As medidas preventivas incluem, dentre outras, a condução de investigações céleres, imparciais e independentes; o estabelecimento de um sistema eficiente de queixas e o processo e punição dos supostos perpetradores.
B. Instituições Penitenciárias
1. Questões Gerais
(a) Registros
87. Em todas as prisões visitadas, o SPT verificou os registros, revisou os arquivos pessoais e manteve conversas com os funcionários das prisões responsáveis por manter e atualizar os
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registros. Enquanto os registros prisionais eram mantidos de forma eletrônica nos sistemas penitenciários do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, os registros das instituições visitadas em Goiás não eram computadorizados e grande parte era feita à mão.
88. O SPT recomenda que se estabeleça um sistema informatizado uniforme em todos os Estados, para o registro de admissões e a manutenção de outros registros.
89. Um exame dos registros prisionais em Ary Franco revelou que sete prisioneiros morreram naquele centro de detenção desde o início de 2011. Na maior parte dos casos, a causa da morte não era clara e/ou as circunstâncias que levaram à morte não se encontravam disponíveis. O SPT tomou nota de que, durante o mesmo período, houve um total de 91 mortes em custódia prisional somente no Estado do Rio de Janeiro.
90. O SPT solicita que o Estado Parte providencie informações detalhadas, incluindo certidões de óbito e relatórios de autópsias sobre a causa e as circunstâncias de todas as mortes que ocorram em locais de detenção, bem como informações sobre as investigações independentes conduzidas a esse respeito.
(b) Separação de categorias de internos
91. O SPT ficou satisfeito em notar que a separação entre homens e mulheres nas prisões era estritamente respeitada, e que as prisioneiras eram geralmente vigiadas por funcionárias mulheres. O SPT observou, contudo – conforme o mencionado acima no tocante às delegacias –, que a falta de instalações adequadas levaram a situações em que prisioneiros condenados eram mantidos juntamente com presos provisórios.
92. Em quase todos os presídios visitados, o SPT notou a presença de grupos criminosos organizados. Os prisioneiros eram mantidos em instalações ou alas separadas com base na facção criminosa a que eram filiados. Nesse sentido, o SPT observou que os arquivos pessoais dos prisioneiros em Ary Franco incluíam uma declaração assinada pelo detento, em que afirmava haver concordado em ser alocado em determinada ala, sob o controle de uma facção em particular, e assumia a responsabilidade por sua própria segurança.
93. O Estado Parte deve garantir a separação efetiva de detentos e presos condenados, de acordo com as obrigações estabelecidas pelas normas internacionais de direitos humanos33. O SPT reitera sua preocupação e a recomendação expressa pelo Relator Especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias e arbitrárias que “prisões devem ser administradas pelos carcereiros e não pelos presos. A prática (...) de forçar novos prisioneiros que nunca pertenceram a nenhuma gangue a escolher uma ao ingressar no sistema penitenciário é cruel e leva ao inchaço das gangues.” 34 A alocação em uma cela ou ala deve ser baseada em critérios objetivos.
(c) Prisões de Segurança Máxima
33 ICCPR, art. 10.
34 A/HRC/8/3/Add.4, parágrafo 21(h).
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94. Em resposta à situação de superlotação extrema nas prisões, o Estado do Espírito Santo adotou um plano, mediante o qual construirá 26 novos estabelecimentos prisionais, alguns no modelo de segurança máxima. Algumas dessas novas instalações foram visitadas pelo SPT, encontravam-se limpas e não tinham problema de superlotação. Um regime extremamente duro e repressivo, entretanto, foi observado. Na prisão masculina provisória Viena II, o SPT observou que os movimentos dos detentos dentro da própria unidade eram objeto de controle estrito, por meio da aplicação da disciplina de grupo. O SPT expressa preocupação com as sequelas psicológicas do regime aplicado nessas prisões, bem como com a possibilidade de o modelo usado no Espírito Santo ser seguido em outros estados brasileiros.
95. O SPT considera que esses tipos de unidade não devem ser a regra e que devem ser evitados especialmente no caso de detentos que ainda não foram julgados. O SPT considera, ainda, que a possível reprodução desse modelo de encarceramento pelas autoridades federais, em outros Estados, deveria ser objeto de estudo ulterior.
2. Condições de detenção
(a) Superlotação
96. Em quase todas as instalações, o número de detentos excedia a capacidade máxima. O SPT encontrou níveis alarmantes de superlotação na Casa de Prisão Provisória Coronel Odenir Guimarães, em Goiás, e no presídio Ary Franco. Como resultado, os detentos têm de se revezar para dormir em finos colchões de espuma no chão, em condições extremamente precárias. O SPT também foi informado que os juízes parecem evitar a imposição de penas alternativas, mesmo para réus primários. O SPT tomou conhecimento ainda de recente legislação que restringe tal possibilidade, o que contribui para a superlotação dos estabelecimentos prisionais.
97. O SPT insta o Estado Parte a reavaliar suas políticas de segurança pública e a tomar as medidas apropriadas, no curto e no longo prazo com vistas a reduzir a superlotação nas prisões35. Os internos devem ser acomodados em consonância com padrões internacionais, com a devida atenção ao conteúdo cúbico de ar e ao mínimo espaço de chão, dentre outros36. Cada prisioneiro deveria ter uma cama separada e roupa de cama limpa37.
98. O SPT recomenda que o Estado Parte promova a aplicação de medidas alternativas à custódia por parte do Judiciário, em conformidade com padrões internacionais38.
(b) Condições Materiais
35 Princípios Interamericanos, princípio XVII.
36 SMRTP, regra 10.
37 SMRTP, regra 19.
38 Regras de Tóquio.
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99. Entre as instituições penitenciárias visitadas pelo SPT, as condições materiais de detenção variaram consideravelmente. Em Coronel Odemir Guimarães-CPP, as condições também variaram entre as diferentes instalações e as alas. Por exemplo, a acomodação em celas no Módulo de Respeito (Bloco 2A) propiciava boas condições de vida. A cela de quarentena para os detidos recém-chegados, entretanto, acomodava, na ocasião da visita, nove detentos, sem leitos e em condições sanitárias completamente inadequadas. As piores condições foram observadas no Bloco 4B, onde eram mantidos criminosos reincidentes condenados por crimes violentos.
100. O SPT recomenda que os internos sejam tratados em bases iguais e de maneira não discriminatória. As condições de vida devem ser harmonizadas de forma a garantir a não-discriminação e a eliminar possíveis fontes de pressão ou de extorsão dos internos. A alocação de um interno em uma determinada cela ou ala de uma prisão deve ocorrer de acordo com critérios objetivos e deve ser registrada de maneira transparente no arquivo pessoal do detento.
101. Solicita-se às autoridades brasileiras que providenciem informação sobre as ações adotadas para reavaliar o uso de celas de quarentena para os detentos recém-chegados, de forma a que essas se adequem aos padrões internacionais.
102. Em Nelson Hungria, os prisioneiros eram alocados em dormitórios de grande capacidade (50 leitos), onde as refeições também eram servidas. Os banheiros ofereciam pouca privacidade. As detentas do presídio feminino Petrolino de Oliveira reclamaram que não havia água quente para o banho.
103. O SPT recomenda às autoridades que desenvolvam um plano para substituir progressivamente os grandes dormitórios por unidades menores. O SPT recomenda, ainda, que as deficiências na infraestrutura de limpeza e saneamento nas instituições penitenciárias sejam sanadas com a devida consideração dos padrões internacionais39.
104. As condições materiais na prisão Ary Franco refletiram um desrespeito acentuado pela dignidade dos internos. As celas em estado mais precário localizam-se no subsolo do prédio principal, especialmente nas áreas em que os prisioneiros necessitam de proteção contra outros detentos (“seguro”). O Corredor A, uma unidade dedicada a prisioneiros protegidos, possuía uma capacidade oficial de 296, mas acomodava 457 detentos na ocasião da visita. A capacidade de acomodação da unidade consistia em 21 celas de multiocupação (30m²), cada uma contendo dois conjuntos de beliches e uma pia ou chuveiro. Cada cela acomodava até 30 detentos, metade dos quais dormiam no chão, sem leito adequado.
105. As celas em Ary Franco eram geralmente escuras, sujas, abafadas e infestadas de baratas e outros insetos. A grave superlotação e a manutenção precária das celas resultaram em condições que criaram graves problemas de saúde para os detentos, como micose e outras doenças da pele e do estômago. Em algumas celas, o SPT pôde perceber que o sistema de esgoto das celas dos pisos superiores estava vazando pelo teto e pelas paredes.
39 SMRTP, regras 12-13.
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106. Além do estado deplorável das instalações das acomodações, havia uma deficiência generalizada no fornecimento de itens de higiene, vestimenta, roupa de cama e outros itens essenciais. O SPT recebeu informações de detentos de que o sabonete custava oito reais e o papel higiênico, cinquenta centavos, valores que muitos prisioneiros não podiam pagar.
107. O SPT concluiu que as condições materiais dessa instituição em geral não estavam em consonância com as regulações nacionais40, nem com os padrões internacionais relevantes, e que a detenção naquelas condições equivalia a tratamento desumano e degradante.
108. O SPT reitera o apelo feito em suas observações preliminares ao Estado no sentido do fechamento imediato da prisão Ary Franco. Em seguida, esse estabelecimento deveria ser desativado permanentemente ou completamente reestruturado e remodelado.
109. O SPT insta o Estado a adotar urgentemente as medidas necessárias para garantir que as condições de detenção nas prisões do país se adaptem às Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros. Um plano de ação para as prisões deve ser elaborado e disseminado, com o objetivo de garantir que as necessidades básicas de todas as pessoas privadas de liberdade sejam atendidas. Como uma questão de prioridade, o Estado deveria realizar uma auditoria nacional quanto às condições materiais das instituições prisionais brasileiras, com vistas a criar e implementar programas de limpeza, renovação e reforma.
110. Os detentos provisórios entrevistados em Viana II reclamaram da alta temperatura de suas celas durante o tempo quente, e também que uma parte dos detentos havia desenvolvido problemas respiratórios devido à precária ventilação. Além disso, os banheiros dentro das células quádruplas (aproximadamente 8m²) eram dispostos de um modo que oferecia pouca privacidade.
111. Medidas apropriadas deveriam ser adotadas para remediar as deficiências relativas à temperatura, ventilação insuficiente e instalações sanitárias nas celas.
c) Banho de sol e atividades
112. O SPT recebeu relatos de acesso insuficiente ao mínimo de uma hora diária de exercício, em conformidade com os padrões internacionais41. As precárias condições materiais nas instalações do Ary Franco são acentuadas pelo fato de os detentos serem trancados em suas celas superlotadas, sem devida ventilação ou iluminação natural, continuamente por até duas ou três semanas (somente dez prisioneiros de cada cela tinham acesso ao rodízio de uma hora de banho de sol por semana). Na penitenciária de segurança máxima de Viana II, para a maioria dos detentos provisórios, o regime era limitado a uma hora de exercício diário ao ar livre, e somente um número reduzido de detentos tinha acesso a programas de educação e trabalho. Os detentos informaram que não tinham acesso a livros de sua escolha.
40 Regras Mínimas.
41 SMRTP, regra 21.
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113. O SPT notou que havia poucas oportunidades disponíveis para os detentos participarem de atividades significativas, ainda que algumas instituições ofereçam algumas oportunidades. Em Nelson Hungria, o SPT observou que 330 prisioneiros estavam frequentando aulas na escola, incluindo educação básica, secundária e superior. A variedade de atividades oferecidas aos detentos no Módulo de Respeito em Coronel Odenir Guimarães-CPP era satisfatória. Observou-se, no entanto, que, em outras unidades dentro da mesma penitenciária, inexistiam oportunidades significativas com relação a educação, trabalho e recreação.
114. O SPT recomenda que todos os internos, sem exceção, tenham acesso a um mínimo de uma hora diária de exercícios ao ar livre. O SPT recomenda que as autoridades relevantes aumentem seus esforços no sentido de garantir que todos os internos tenham acesso a atividades e de melhorar os programas de atividades oferecidas em estabelecimentos penitenciários em todo o país.
d) Contato com o mundo externo
115. Em muitas prisões, o SPT foi informado pelos detentos que os mesmos tinham acesso muito limitado à comunicação por telefone ou carta. O SPT também recebeu alegações relativas a não entrega de correspondência.
116. Em Viana II, detentos provisórios alocados em regime de segurança máxima tinham um horário de visitas de duas horas por semana e visitas íntimas quinzenais. Os locais de visita eram adequados, mas a localização geográfica dos novos centros de detenção construídos no Espírito Santo era problemática e os detentos frequentemente eram mantidos longe de suas famílias. Aos detentos de segurança máxima não era permitido fazer ligações telefônicas, receber encomendas ou guardar pertences.
117. O SPT recomenda que todos os presos tenham permissão para, sob a supervisão necessária, comunicarem-se regularmente por carta, telefone e visitas, com seus familiares e outras pessoas.
118. O SPT recebeu muitas reclamações relativas aos procedimentos de revista intrusivos e humilhantes nos locais de visita, inclusive para mulheres idosas e crianças, que eram obrigadas a se submeter a revistas íntimas. Outra queixa recorrente referia-se aos frequentes atrasos na emissão dos passes para os visitantes.
119. O SPT recomenda que o Estado garanta que as revistas cumpram com os critérios de necessidade, razoabilidade e proporcionalidade. Se conduzidas, as revistas corporais devem ser realizadas em condições sanitárias adequadas; por pessoal qualificado, do mesmo sexo do indivíduo revistado; e devem ser compatíveis com a dignidade humana e com o respeito aos direitos fundamentais. Revistas intrusivas, como vaginais e anais, devem ser proibidas por lei42. A emissão de passes para os visitantes deve ser agilizada.
42 UNCAT, art. 16; Regras de Bangkok, regras 19 a 21; Princípios Interamericanos, princípio XXI.
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120. O SPT expressou preocupação com os relatos recebidos de que mães com filhos na prisão estavam sendo privadas de seu direito de ter a guarda dos filhos maiores de dois anos, os quais, em alguns casos, eram colocados para adoção.
121. O SPT recomenda que as decisões quanto a permitir que as crianças permaneçam com suas mães na prisão sejam baseadas no melhor interesse das crianças e em cuidadosas avaliações individuais43. O SPT solicita ainda que o Estado apresente esclarecimentos quanto à prática de se colocarem as crianças para adoção e sobre a aplicação da legislação quanto à custódia infantil nestas situações.
e) Comida e água potável
122. Muitos detentos se queixaram de que a comida da prisão era de má qualidade. Detentos do presídio Coronel Odenir Guimarães-CPP relataram restrições no abastecimento de água.
123. O SPT recomenda que as autoridades brasileiras intensifiquem os procedimentos de verificação da qualidade da comida, para garantir que todas as refeições sejam preparadas de maneira higiênica, em quantidade suficiente e com a qualidade e variedade nutricionais para a manutenção da saúde dos detentos.
3. Disciplina e sanção
124. O SPT observou que o direito brasileiro44 contém dispositivos relativos a sanções disciplinares aplicáveis a pessoas privadas de liberdade. Durante suas visitas, o SPT se deparou com muitos prisioneiros que eram detidos em celas de isolamento disciplinar. A partir das entrevistas com esses detentos, ficou claro que a punição era frequentemente aplicada como reação às reclamações, de modo regular. Também ficou evidente que os detentos não confiavam em nenhum mecanismo de queixa disponível. De acordo com alegações de detentos no presídio Nelson Hungria, os prisioneiros mantidos em segregação disciplinar eram confinados 24 horas por dia, por trás de uma porta dupla de metal. As sete celas de punição, nesse presídio, eram frequentemente inundadas pela água da chuva.
125. O SPT reitera sua recomendação às autoridades de que se assegure que nenhuma forma de punição será aplicada como resposta a reclamações; O SPT recomenda ainda que não sejam utilizadas punições coletivas e que as mesmas sejam proibidas por lei45.
4. Tortura e maus-tratos
126. Vários detentos se queixaram de abusos e maus-tratos envolvendo insultos, sanções arbitrárias e humilhação por parte dos guardas das prisões. Em Ary Franco, o SPT observou que a atmosfera geral era altamente repressiva e caracterizada pelo contínuo tratamento degradante dos internos. O SPT recebeu relatos consistentes de maus-tratos, incluindo a
43 Regras de Bangkok, regras 49 e 52.
44 Lei de Execução Penal, decreto de lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984.
45 Princípios Interamericanos, princípio XXII.4.
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destruição de pertences pelos agentes penitenciários ou pelos “faxinas”. Os internos eram forçados a adotar posições humilhantes durante transferências ou inspeções. Por fim, o SPT também recebeu alegações de espancamentos.
127. O SPT também demonstrou preocupação com as alegações de graves maus-tratos e condições desumanas de transporte nos veículos dos Serviços de Operações Especiais (SOE). Os métodos utilizados pelo pessoal do SOE, segundo estas alegações, incluíam trancar um grande número de detentos em posições desconfortáveis, algemados e sem ventilação; abrir as portas para espirrar spray de pimenta nos detentos e depois fechar o veículo. Espancamentos, insultos e ameaças também foram relatados.
128. Em Viana II, o SPT ouviu ainda relatos de maus-tratos e de uso excessivo da força pelos guardas da prisão, em especial o uso de gás lacrimogêneo em espaços de confinamento, incluindo as celas. O SPT tem sérias reservas ao uso, em locais de confinamento, de gases que causam irritação, uma vez que podem ocasionar riscos à saúde e causar sofrimento desnecessário.
129. Como medida de urgência, o SPT insta o Estado Parte a:
a) garantir a realização de uma investigação expedita e imparcial a respeito de todas as reclamações de tortura e tratamento degradante, de acordo com os artigos 12 e 13 da Convenção contra a Tortura;
b) reafirmar inequivocamente a absoluta proibição da tortura e publicamente condenar tal prática, juntamente com um aviso claro de que quem quer que cometa tais atos ou seja cúmplice dos mesmos será pessoalmente responsabilizado perante a lei e estará sujeito à persecução criminal e devidas penalidades;
c) garantir que, em casos de tortura ou maus-tratos, os suspeitos sejam imediatamente suspensos de suas atribuições por toda a duração da investigação e, se condenados, exonerados de seus cargos;
d) Estabelecer regras claras sobre o uso de gases irritantes, de modo a garantir que eles sejam usados em estreita conformidade com os princípios da proporcionalidade e necessidade. Deve ser mantido um registro sobre o uso de qualquer tipo de força, incluindo força não-letal.
C. Instituições para Crianças e Adolescentes
1. Questões gerais
a) Legislação sobre crianças e adolescentes
130. Durante a visita, o SPT expressou preocupação com o fato de que a privação de liberdade de crianças e adolescentes não era utilizada como último recurso, contrariamente ao espírito do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990. Ademais, as instituições em que as crianças e adolescentes eram mantidos, em geral, não diferiam muito
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de prisões comuns para adultos, com um sistema disciplinar muito rígido. As autoridades com as quais o SPT se encontrou em São Paulo reconheceram o aumento significativo no número de crianças e adolescentes privados de liberdade o que, em sua opinião, demonstra uma falha nas políticas de prevenção, especialmente nos setores de tráfico de drogas e de dependência química.
131. O SPT demonstrou preocupação com a falta de ênfase na dimensão socioeducativa do sistema juvenil. Na prática, pouca análise e apoio foram disponibilizados com vistas a permitir a reintegração de crianças e adolescentes na sociedade. O SPT ficou com a impressão de que faltava treinamento especializado para a equipe técnica.
132. A fim de garantir a completa implementação do ECA em consonância com os padrões internacionais e tendo em mente o melhor interesse da criança46, o SPT recomenda que:
a) as crianças e adolescentes só sejam privadas de sua liberdade em última instância, pelo menor tempo possível, com possibilidade de revisão da medida;
b) seja realizada uma mudança de abordagem, do punitivo para o preventivo47, a fim de se evitar uma maior estigmatização e criminalização das crianças. A infraestrutura e os recursos humanos existentes deveriam ser melhorados e o treinamento do pessoal aperfeiçoado;
c) o Estado Parte amplie a educação técnica oferecida às crianças e adolescentes mantidos nos centros, de modo a possibilitar sua reintegração em sua comunidade e na sociedade como um todo;
d) o Estado Parte mantenha e encoraje a participação dos pais durante todo o período de implementação das medidas sócio-educativas, com vistas a permitir a crianças e adolescentes um contato constante com suas famílias.
b) Salvaguardas legais quanto à custódia policial, cadeias públicas e instituições sócio-educativas
133. Com base nas numerosas entrevistas realizadas, o SPT descobriu que a proteção especial de que as crianças e adolescentes necessitam não era disponibilizada a partir do momento da prisão. Os entrevistados relataram práticas de abusos físicos, alguns beirando a tortura, além da falta de salvaguardas legais.
134. O SPT congratula-se com o completo envolvimento de defensores públicos em centros para crianças e adolescentes. O SPT demonstrou, entretanto, preocupação com a falta de informações transparentes às crianças, acerca de seu processo judicial e do sistema em vigor para avaliar seu progresso e habilidade de reintegração social. O SPT também
46 Convenção sobre os Direitos da Criança, arts. 37(b), 39 e 40; Regras de Beijing, adotadas pela resolução 40/33 da AGNU; Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade, resolução 45/113 da AGNU.
47 Em consonância com as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riyadh), resolução 45/112 da AGNU.
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demonstrou preocupação com a ausência das visitas de promotores e juízes às instituições sócio-educativas.
135. O SPT recomenda que:
a) todas as garantias legais carreadas pelo ECA sejam aplicadas à criança ou ao adolescente desde o momento de sua detenção;
b) seja dada prioridade à redução do número de crianças detidas sem uma determinação judicial, bem como à redução da duração da privação de liberdade quando houver fortes razões para que essa privação ocorra48;
c) as crianças recebam defesa legal apropriada ao longo de todos os estágios dos procedimentos legais, inclusive durante os depoimentos policiais49, e que inspeções regulares dos centros sócio-educativos sejam realizadas por juízes e promotores.
2. Condições de detenção
136. Apesar das boas condições materiais observadas nas unidades de internação para meninas (Educandário Santos Dumont no Rio de Janeiro e Mooca em São Paulo), bem como no CNESE Gelso de Carvalho Amaral no Rio de Janeiro e CASA Nogueira em São Paulo, o SPT demonstrou preocupação com as condições gerais em que as pessoas de 12 a 21 anos eram mantidas. A situação foi considerada ainda pior nos centros onde as crianças e os adolescentes eram reincidentes.
137. Na maior parte das instituições visitadas no estado de São Paulo e no Instituto Padre Severino, no Rio de Janeiro, o SPT demonstrou preocupação com as precárias condições materiais de detenção. A delegação encontrou superlotação nas celas, leitos inadequados, acesso inadequado a materiais de higiene, além de vestimentas precárias. Foram fornecidas ao SPT amostras da comida distribuída às crianças, algumas pareciam estar podres.
138. O SPT recomenda que o Estado forneça, de acordo com os padrões internacionais, alimentação e acomodação adequadas, assim como os itens mínimos necessários para que as pessoas vivam, enquanto detidas, em condições mínimas de dignidade no que se refere à higiene.
139. O SPT recomenda ainda que:
a) se finalize o novo centro que está sendo construído no complexo Padre Severino, a fim de garantir o fechamento dos dormitórios em más condições no centro principal e de reduzir a grave situação de superpopulação naquele centro;
48 Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade, regra 17.
49 Regras de Beijing, parágrafo 7.1.
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b) o Estado Parte acelere o processo de descentralização, para possibilitar que as crianças e adolescentes permaneçam em instituições mais próximas a suas famílias.
3. Disciplina e sanção
140. O SPT demonstrou preocupação com o regime bastante rígido e militarista observado em instalações para crianças e adolescentes. No concernente ao uso das tropas de segurança para manter a disciplina, o SPT se refere à seção IV.C.4. Em Viana II, crianças e adolescentes encontravam-se detidas em uma instalação de segurança máxima, com procedimentos internos muito rigorosos. Nessas instalações, o SPT expressou muita preocupação com a situação psicológica e de saúde das crianças, algumas das quais estavam fortemente medicadas.
141. O SPT notou a existência de uma ouvidoria para crianças e adolescentes. Na prática, entretanto, os entrevistados que relataram maus-tratos ou outras formas de abusos foram impossibilitados de relatar tais abusos a terceiros independentes e imparciais. O SPT demonstrou grande preocupação a respeito do medo de represálias, expressado pela maior parte das crianças e adolescentes.
142. O SPT recomenda ao Estado que adote medidas práticas para garantir o direito de crianças e adolescentes submeterem petições ou recursos relativos ao seu tratamento a autoridades independentes com poderes remediadores apropriados, inclusive no que se refere a medidas disciplinares, sem medo de represálias.
4. Tortura e maus-tratos
a) Prisões provisórias
143. O SPT recebeu alegações consistentes e numerosas de maus-tratos no Fórum Brás e no prédio contíguo ao Rio Nilo, ambos instalações de detenção provisória adjacentes ao Tribunal do Brás, em São Paulo. Crianças e adolescentes relataram uma atmosfera militar, com disciplina rígida. O SPT observou que os detentos olhavam para o chão e mantinham as mãos nas costas, sem permissão para falar. O SPT observou hematomas (olhos roxos) nos rostos de alguns detentos.
b) Instituições para crianças e adolescentes
144. Embora as autoridades tenham insistido na natureza psicológica do trabalho nos centros de detenção e a ausência de pessoal armado dentro dos centros para crianças e adolescentes, o SPT demonstrou grande preocupação, especialmente nos centros de reincidentes, com relação à tensão existente entre os detentos e o os funcionários.
145. Por meio de entrevistas conduzidas com diversas crianças e adolescentes, o SPT recebeu alegações confiáveis e reiteradas de tortura e maus-tratos. Essas alegações envolvem espancamentos – realizados pelos funcionários e aplicados na nuca e em outras partes do corpo – com a mão aberta, bastões de madeira ou metal. A prática inclui ainda despir crianças e adolescentes, forçando-os a ficar em pé em posições desconfortáveis, além
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de insultá-los e ameaçá-los. Como observação geral, o SPT notou que se recorria a práticas humilhantes como forma de manutenção da disciplina. Na Unidade de Internação Jatobá, em São Paulo, o SPT coletou evidências de negação e acobertamento, por parte da equipe médica, de lesões. Na instituição para crianças e adolescentes no Espírito Santo, que era gerida como um presídio de segurança máxima, houve quatro tentativas de suicídio e um suicídio de fato nos últimos sete meses.
146. Um elemento de extrema preocupação foi o envolvimento das tropas de choque na manutenção da disciplina e na repressão de motins. Comumente, essas tropas permaneceriam do lado de fora dos centros e interviriam somente quando solicitadas a fazê-lo pela administração, em caso de motins. O SPT recebeu, entretanto, uma grande quantidade de alegações confiáveis de que as tropas de choque seriam frequentemente, se não sistematicamente, solicitadas a entrar e a aplicar força de maneira excessiva. As tropas empregariam ainda práticas humilhantes após a revista de uma instituição ou quando da ocorrência de motins, ou mesmo de desentendimentos entre uma criança ou adolescente e funcionários. Em um centro, essas intervenções teriam acontecido três vezes em uma semana. As crianças mostraram ao SPT ferimentos recentes resultantes desses espancamentos. Esse tipo de tratamento era muitas vezes imposto mediante a participação de outros agentes, ou mesmo de diretores da instituição. O SPT recebeu frequentes alegações de que atos de tortura e maus-tratos foram levados acabo contra crianças e adolescentes em salas ou espaços escondidos das câmeras de vídeo existentes.
147. Com relação a centros para meninas, o SPT demonstrou preocupação, especificamente em um dos centros, com relação ao sistema de “modo silencioso” que é imposto às recém-chegadas em suas primeiras 24 horas no centro, ou como forma de punição.
148. O SPT considera que as alegações acima são exemplos de tortura e maus-tratos, físicos ou mentais, ainda mais preocupantes devido à pouca idade das vítimas. À luz da consistência das alegações recebidas, o SPT considera que a tortura, os maus-tratos e outras formas de abuso eram praticadas na maior parte das instituições sócio-educativas visitadas.
149. O SPT reitera sua categórica condenação a todos os atos de tortura e maus-tratos. O SPT relembra que as crianças privadas de liberdade devem ser tratadas de maneira consistente com a promoção do senso de dignidade e valor da criança, reforçando seu respeito pelos direitos humanos de outros e levando em conta a idade da criança e o desejo de que ela se reintegre à sociedade50. O SPT solicita ser informado acerca de qualquer plano de ação que seja elaborado para erradicar a tortura e os maus-tratos em instituições para crianças e adolescentes.
150. O uso da “tropa de choque” deve ser limitado a casos excepcionais e autorizado apenas pela mais alta autoridade estatal relevante, de acordo com critérios claros e estabelecidos. Relatar cada operação e empreender o monitoramento externo das mesmas deve ser obrigatório.
50 Convenção sobre os Direitos da Criança, arts. 37 e 40.
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D. Outras Instituições
1. Centro de Tratamento de Dependência Química Roberto Medeiros, no Rio de Janeiro
151. Essa instituição não oferecia qualquer tratamento psiquiátrico e psicológico específico para o vício em drogas, exceto altas doses de medicamentos psicotrópicos ministradas a 95% dos pacientes. Os indivíduos detidos devido a medidas de segurança advindas de uma ordem judicial permaneciam ali por períodos indefinidos, sem previsão de tratamento ou projetos de reabilitação ou reintegração social.
152. O SPT recomenda que haja uma revisão periódica, pelas autoridades judiciais, quanto às medidas de segurança aplicadas a pessoas admitidas em instituições para o tratamento de dependência química. As autoridades judiciais devem avaliar, regularmente, a necessidade quanto à admissão involuntária, baseando-se em pareceres médicos. Alternativas à internação involuntária devem ser sempre consideradas e utilizadas, quando apropriado51.
153. Tanto a infraestrutura quanto o tratamento recebido pelos pacientes era mais parecido com o de uma prisão do que de um hospital, como evidenciado pela arquitetura das instalações e pelo fato de que os pacientes tinham de manter suas cabeças abaixadas e as mãos para trás quando caminhavam pela instituição e quando falavam com algum funcionário. A equipe de saúde mental encontrava-se sob estresse, mal paga, desmotivada e sujeita à autoridade dos guardas da prisão. A equipe não tinha conhecimento específico sobre o tratamento de dependentes químicos; uma verdadeira terapia de desintoxicação não se encontrava em curso. No entendimento do SPT, o objetivo dessa instituição era punitivo e não terapêutico.
154. O SPT recomenda que o Estado melhore a infraestrutura dessa instituição, a fim de adequá-la a seu objetivo terapêutico. O SPT recomenda a melhoria das condições de trabalho da equipe, particularmente a de saúde mental, bem como o oferecimento de oportunidades regulares de treinamento, inclusive sobre assuntos relacionados à dependência química. Os dependentes químicos deveriam ser transferidos de unidades de detenção para centros especializados, a fim de se beneficiarem de serviços e tratamentos especializados.
2. Unidade Experimental de Saúde, em São Paulo
155. Essa instalação albergava seis jovens, de 20 a 22 anos, que foram sentenciados por crimes graves cometidos quando eram menores de idade. O SPT impressionou-se positivamente pelas condições materiais dessa unidade, bem como pela proporção entre detentos e funcionários e pelo profissionalismo da equipe técnica responsável.
51 Princípios para a proteção de pessoas com deficiência mental e melhoria do tratamento de saúde mental, resolução 46/119, e Princípios Interamericanos, princípio III.3.
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156. Essa unidade foi criada sob a égide do predecessor da Fundação CASA e posteriormente foi transferida para a Secretaria de Saúde de São Paulo, em virtude de um decreto executivo. A Unidade Experimental de Saúde não é uma unidade de medidas socioeducativas, nem foi prevista pelo ECA. Tampouco se trata de uma prisão, centro de detenção preventiva, ou hospital de custódia e tratamento. Os detidos nessa unidade já tinham cumprido a sentença máxima de 3 anos como menores. Eles permaneceram, entretanto, detidos por um período de tempo ilimitado devido a sua suposta periculosidade. O SPT expressa grande preocupação com a situação legal dos detidos nesse centro e com o sofrimento mental que uma detenção sem prazo definido pode causar.
157. O SPT recomenda que a unidade de saúde experimental seja desativada. O SPT também recomenda que se respeitem estritamente as disposições do ECA, de acordo com as quais o período máximo de internação de crianças e adolescentes não deve exceder três anos e a liberação deve ser compulsória aos vinte e um anos52.
52 ECA, art. 121, parágrafos 3 e 5.
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Anexos
Anexo I
Lista de pessoas com as quais o SPT se encontrou
I. Autoridades
A. Brasília
• Gleisi Hoffmann, Ministra-Chefe da Casa Civil;
• Antônio de Aguiar Patriota, Ministro das Relações Exteriores;
• Maria do Rosário Nunes, Ministra-Chefe da Secretaria de Direitos Humanos;
• José Eduardo Cardozo, Ministro da Justiça;
• Afonso Carlos Roberto Prado, Defensor Público Geral em exercício;
• Luciano Losekan, Juiz, Coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário;
• Francástro das Neves Coelho, Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário
• Márcio André Kepler Fraga, Juiz, Conselho Nacional de Justiça;
• Gilda Pereira de Carvalho, Subprocuradora-Geral da República e Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão;
• Ramaís de Castro Oliveira, Secretário Executivo da Secretaria de Direitos Humanos;
• Maria Ivonete Barbosa Tamboril, Secretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos;
• Fábio Balestro Floriano, Diretor, Departamento de Relações Internacionais, Secretaria de Direitos Humanos;
• Michelle Morais de Sá e Silva, Coordenadora-Geral de Cooperação Internacional, Secretaria de Direitos Humanos;
• Aldo Zaiden Benvindo, Coordenador-Geral, Coordenação-Geral de Saúde Mental e Combate à Tortura;
• Mateus do Prado Utzig, Coordenação-Geral de Saúde Mental e Combate à Tortura;
• Regina Maria Filomena de Luca Miki, Secretária Nacional de Segurança Pública;
• Augusto Eduardo de Souza Rossini, Diretor-Geral, Departamento Penitenciário Nacional;
• Jayme Jemil Asfora Filho, Presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
• Arcelino Vieira Damasceno, Diretor, Sistema Penitenciário Federal;
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• Membros do Comitê Nacional de Prevenção e Controle da Tortura;
• Christiana Freitas, Coordenadora-Geral, Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana;
• Percílio de Sousa Lima Neto, Vice-Presidente, Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana;
• Eugênio José Guilherme Aragão, Professor de Direito Penal, Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana;
• Carlos Eduardo da Cunha Oliveira, Ministério das Relações Exteriores;
• Ivana Farina Navarrete Pena, Promotora, Estado de Goiás;
• Domingos Sávio Dresch da Silveira, Ouvidor Nacional de Direitos Humanos;
• Manuela D’Ávila, Deputada Federal, Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias;
• Paulo Paim, Senador.
B. São Paulo
• Berenice Maria Giannella, Presidente, Fundação CASA;
• Antônio Ferreira Pinto, Secretário Estadual, Secretaria de Segurança Pública;
• Arnaldo Hossepian S. L. Júnior, Vice-Secretário, Secretaria de Segurança Pública;
• Lourival Gomes, Secretário de Estado, Secretaria de Administração Penitenciária;
• Eloísa de Sousa Arruda, Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania;
• Daniela Solberger Cembrenelli, Defensora Pública;
• Adriano Diogo, Deputado Estadual, Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Assembléia Legislativa Estadual;
• Sérgio Turra Sobrane, Subprocurador-Geral de Justiça;
• Eduardo Ferreira Valério, promotor de justiça de Direitos Humanos.
C. Rio de Janeiro
• Membros do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Rio de Janeiro;
• Marcelo Freixo, Deputado Estadual, Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Assembléia Legislativa Estadual;
33
• Roberto Cesário Sá, Subsecretário de Planejamento e Integração Operacional;
• Sauler Sakalem, Subsecretário Adjunto de Unidades Prisionais;
• Jorge Perrote, Coordenador de Segurança, Secretaria de Administração Penitenciária;
• Martha Mesquita da Rocha, Chefe de Polícia Civil;
• Antônio Carlos Biscaia, Subsecretário de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos;
• Andréa Sepúlveda Brito Carotti, Subsecretaria de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos;
• Nilson Bruno Filho, Defensor Público Geral.
D. Espírito Santo
• Ângelo Roncalli de Ramos Barros, Secretário Estadual de Justiça;
• Silvana Gallina, Diretora do IASES (Instituto de Atendimento Sócio-Educativo do Espírito Santo);
• André Luiz Moreira, Presidente, Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente;
• Gilmar Ferreira de Oliveira, Presidente, Conselho Estadual dos Direitos Humanos;
• André Carlos de Amorim Pimentel Filho, Promotor Regional dos Direitos Humanos.
E. Nações Unidas
• Jorge Chediek, Coordenador Residente do Sistema ONU no Brasil.
F. Sociedade Civil
• ACAT Brasil;
• CEJIL;
• Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, Universidade Cândido Mendes;
• Centro de Apoio aos Direitos Humanos, Espírito Santo;
• Centro de Defesa dos Direitos Humanos, Espírito Santo;
• CONECTAS;
• Grupo Tortura Nunca Mais;
• Justiça Global;
• Ordem dos Advogados do Brasil – OAB;
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• Pastoral Carcerária Nacional.
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Anexo II
Locais de Privação de Liberdade
I. Instituições penitenciárias
• Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia [Prisão Masculina Coronel Odenir Guimarães, instalações de detenção pré-julgamento, (“Núcleo de custódia”)], Goiás;
• Prisão masculina Ary Franco, Rio de Janeiro;
• Prisão masculina Vicente Piragibe, Complexo Gericinó (Bangu), Rio de Janeiro;
• Prisão feminina Nelso Hungria (Bangu VII), Complexo Gericinó (Bangu), Rio de Janeiro;
• Prisão feminina Petrolino de Oliveira (Bangu VIII), Complexo Gericinó (Bangu), Rio de Janeiro;
• Instalações de detenção pré-julgamento Viana II, Complexo de Viana, Espírito Santo;
• Unidade feminina de detenção pré-julgamento (CDP-FVV), Complexo Penitenciário Regional Vila Velha, Espírito Santo;
II. Instituições policiais
• Polinter Neves, Rio de Janeiro;
• 76º Delegacia de Polícia, Niterói, Rio de Janeiro;
• Polinter Grajaú, Rio de Janeiro;
• 59ª Delegacia de Polícia, Duque de Caxias, Rio de Janeiro;
III. Instalações para crianças e adolescentes
• Unidade de Internamento de Belém, São Paulo;
• Complexo Franco da Rocha (Unidades de Internamento Jacarandá e Tapajós), São Paulo;
• Unidade de Internamento Franco da Rocha (Internato Franco da Rocha), São Paulo;
• Instalações judiciárias de detenção provisória no Brás, São Paulo;
• Complexo Vila Maria (Unidades de Internamento Jatobá e Nogueira), São Paulo;
• Unidades femininas de internamento na Mooca, São Paulo;
• Instituto Padre Severino, Rio de Janeiro;
• Educandário Santos Dumont (jovens do sexo feminino), Rio de Janeiro;
• CENSE Gelso de Carvalho Amaral, Rio de Janeiro;
• Unidade de Internação Socioeducativa, Complexo Penitenciário Regional em Vila Velha, Espírito Santo.
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IV. Outras instalações
• Unidade Experimental de Saúde, São Paulo;
• Centro de Tratamento em Dependência Química Roberto Medeiros, Complexo Gericinó (Bangu), Rio de Janeiro.
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